quinta-feira, 20 de setembro de 2012

A política na Doutrina Social da Igreja. Por Pe. José Ionilton

Apresentaremos a seguir textos dos documentos do Magistério da Igreja sobre a dimensão política da vocação cristã. Esperamos, com isto, oferecer aos nossos leitores e às nossas leitoras um subsídio para estudo pessoal e pastoral neste ano de eleição.
1. Concílio Vaticano II
<> Gaudium et Spes
75f - "Os que são idôneos ou possam tornar-se para exercer a difícil e ao mesmo tempo nobilíssima arte política, preparem-se para ela e procurem exerce-la, esquecidos do proveito próprio e de vantagens materiais. Pela integridade e com prudência, lutem contra a injustiça e a opressão, ou o absolutismo e a intolerância, seja de um homem ou de um partido político; dediquem-se, porém, ao bem de todos com sinceridade e retidão, bem mais, com o amor e a coragem exigidos pela vida pública".
Podemos destacar:
a) A definição de política como "difícil e nobilíssima arte". Não se justifica, portanto, a desculpa de muitos cristãos e de muitas cristãs de não gostarem de política, afirmando ser ela uma coisa suja. Pode ser difícil, mas a política é uma coisa nobre, boa;
b) A necessidade de preparação daqueles e daquelas que se sentem convocados para a atuação na política, aparece bem claro na afirmação:"preparem-se para ela". Aqui a importância das Escolas de Fé e Política que já existem em muitas Comunidades, Paróquias e Dioceses. Onde não existe fica o desafio para implantar, pois, a Igreja precisa preocupar-se com a formação dos que já atuam e dos que querem atuar no mundo da política;
c) O convite para exercer a política sem querer tirar "proveito próprio". Como faz falta a existência de políticos assim, que se "dediquem ao bem de todos", sem buscar "vantagens" pessoais. 
d) O político cristão deverá ter por missão "lutar contra a injustiça e a opressão". O cristão e a cristã atuam na política para promoverem a justiça, o respeito à pessoa humana, a igualdade de direitos e deveres, a partilha e a paz.
75a  - "Lembrem-se, portanto, todos os cidadãos ao mesmo tempo do direito e do dever de usar livremente seu voto para promover o bem comum".
Destacamos aqui o convite para se usar livremente do voto. Temos assim uma das qualidades do voto cidadão, que seja livre, ou seja, devemos votar na pessoa que nossa consciência aponta como a que melhor pode "promover o bem comum". Bem comum que é a meta final da ação política autêntica.
<> Apostolicam Actuositatem
14a - "Os católicos versados em política, e devidamente firmes na fé e na doutrina cristã, não recusem cargos públicos, se puderem por uma digna administração prover o bem comum e ao mesmo tempo abrir caminho para o Evangelho".
Podemos destacar:
a) O convite aos católicos e às católicas para não recusarem cargos públicos. Um convite bastante provocador e ao mesmo tempo incentivador. Provocadorpara quem defende a tese da ausência da política; incentivador para quem já assumiu esta difícil e nobilíssima missão;
b) A razão pela qual o cristão e a cristã deve assumir cargos públicos:promover o bem comum e abrir caminho para o evangelho. Para que razões mais significativas para esta atuação política dos cristãos e das cristãs através do exercício de cargos públicos, seja aqueles que se assume a partir das eleições, seja aqueles que se assume por concurso ou ainda os que se assume como cargo de confiança.
2. Conferências do Episcopado latino americano
<> Medellín
16b  - "O exercício da autoridade política e suas decisões têm como única finalidade o bem comum".
Medellín afirma que a "única finalidade" da política é a promoção do "bem comum". É para isto que existe a política e é para isto que os cristãos e cristãs devem atuar na política: promover o bem comum, usando as palavras de Jesus, promover a vida para todos e vida em abundância (cf. Jo 10,10).
16d - "A carência de uma consciência política (...) torna imprescindível a ação educadora da Igreja, com vistas a que os cristãos considerem sua participação na vida política da nação como um dever de consciência e como o exercício da caridade em seu sentido mais nobre e eficaz para a vida da comunidade".
Em 1968 constatava-se uma carência de consciência política entre os cristãos. 40 anos depois podemos dizer que houve uma melhora desta consciência, mas ainda é real para nós esta constatação de Medellín. Como precisamos avançar nesta consciência do valor da política para a construção de um mundo melhor.
A atualidade da afirmação de que se "torna imprescindível a ação educadora da Igreja"Tal como em 1968, hoje a Igreja precisa educar para a cidadania, para a vivência da política. Esta afirmativa de Medellín vem reforçar a importância das Escolas de Fé e Política. Precisamos apoiar as que funcionam; revitalizar as que passam por dificuldade; começar onde não existe. Elas são, de fato, imprescindíveis para o crescimento da consciência política dos cristãos e das cristãs em nossas comunidades, paróquias e dioceses.
<> Puebla
513 - "A dimensão política, constitutiva da pessoa, representa um aspecto relevante da convivência humana".
É muito significativa a afirmação de que a dimensão política é parte da vida da pessoa humana. Puebla com esta afirmação está nos indicando que quando deixamos de assumir a dimensão política em nossas vidas, estamos nos tornando menos gente, menos humanos.
514 - "A fé cristã não despreza a atividade política; pelo contrário, a valoriza e a tem em alta estima".
Esta é uma das mais belas declarações do valor da política para os cristãos e as cristãs. A fé cristã além de não desprezar a atividade política, a valoriza e vai muito mais além, a tem em alta estima. Quem assume, valoriza e tem em alta estima a atividade política está vivendo autenticamente sua fé cristã, está em perfeita sintonia com a doutrina social da Igreja. Já quem se omite, despreza, desvaloriza a atividade política está agindo de forma contrária à fé cristã e ao ensinamento da Igreja.
515 - "O cristianismo deve evangelizar a totalidade da existência humana, inclusive a dimensão política".
Puebla inclui a dimensão política no rol das atividades da evangelização do cristianismo. De fato, existe uma tendência da parte de alguns cristãos e de algumas cristãs de entenderem a evangelização, apenas, numa dimensão espiritual. O documento de Puebla é claro ao indicar a dimensão política da existência humana como campo da ação evangelizadora de nossa Igreja.
<> Santo Domingo
99 - "Os pastores procuraremos, com objetivo pastoral imediato, fomentar a preparação de leigos que se sobressaiam no campo da educação, da política, dos meios de comunicação social, da cultura e do trabalho".
É interessante notar com os Bispos definiram como objetivo pastoral imediato a preparação dos leigos para atuarem em diversos campos da sociedade, incluindo aí a política. Com isto vemos a importância da política para a vida e a missão dos cristãos leigos e das cristãs leigas. Cabe avaliarmos se depois de 16 anos da promulgação do documento de Santo Domingo, se as dioceses e paróquias do Brasil estão fomentando esta formação dos leigos e das leigas e se estão sendo formados para atuarem no mundo da política. Se sim, que bom! Se, não, está na hora de lembrarmos aos nossos bispos e párocos este seu compromisso.
<> Aparecida
75 - "Vem se fortalecendo a democracia participativa e estão se criando maiores espaços de participação política".
Destaca-se aqui a constatação que o documento de Aparecida faz de que ademocracia participativa está se fortalecendo. Atuar nestes espaços de democracia participativa é uma das formas de se viver a dimensão política de nossa vocação cristã. Será que estamos atuando nos Conselhos Municipais, nos grupos do Orçamento Participativo, no acompanhamento das atividades da Câmara de Vereadores, na fiscalização da aplicação correta dos recursos públicos pelo poder executivo municipal, estadual e federal? Se sim, estamos incluídos entre os que estão fortalecendo a democracia participativa em nosso país; se não, é hora de começar, depende de nós, vamos ocupar nosso lugar, vamos ser o sal da terra e a luz do mundo.
77 - "Em amplos setores da população, e especialmente entre os jovens, cresce o desencanto pela política e particularmente pela democracia".
É preocupante esta constatação do documento de Aparecida. A pior coisa é o desencanto, pois, perdemos a vontade de colaborar. Portanto, devemos trabalhar como Igreja para não deixar que este desencanto permaneça ou cresça, mas, sim ajudar a fazer com que nossa presença de cristãos e cristãs no mundo da política sirva para dar uma novo rosto à política e devolva a motivação à população, de modo especial aos jovens, de participar da vida pública e de acreditar na democracia.
3. Documentos dos Papas
<> Paulo VI na Exortação Apostólica "Evangelii Nuntiandi"
70 - "O campo próprio da sua atividade evangelizadora (referia-se aos Leigos) é o mesmo mundo vasto e complicado da política, da realidade social e da economia, como também o da cultura, das ciências e das artes...".
A política, portanto, é um campo próprio da atividade evangelizadora dos cristãos leigos e das cristãs leigas. O que significa dizer que o leigo e a leiga não podem deixar de atuar na política, porque se não atuarem estarão vivendo de forma incompleta a sua vocação. Paulo VI reconhece que esta missão na política é vasta e complicada, mas é missão e precisa ser assumida pelos leigos e leigas.
<> João Paulo II na Exortação Apostólica "Christifideles Laici"
42 - "Os fiéis leigos não podem absolutamente abdicar da participação política, (...) destinada a promover orgânica e institucionalmente o bem comum".
Em outras palavras os fiéis leigos não podem renunciar, abandonar, desistir da participação política. Por quê? Porque a participação política tem como objetivo final a promoção do bem comum; e o bem comum tem tudo a ver com a nossa missão evangelizadora, com a nossa missão visando a construção do Reino de Deus.
42 - "As acusações de arrivismo, idolatria de poder, egoísmo e corrupção que muitas vezes são dirigidas aos homens do governo, do parlamento, da classe dominante ou partido político, bem como a opinião muito difusa de que a política é um lugar de necessário perigo moral, não justificam minimamente nem o ceticismo nem o absenteísmo dos cristãos pela coisa pública".
Ou seja, para o Papa João Paulo II, não existe desculpa para a não participação dos leigos e leigas na política. Quanto mais nos ausentarmos, mas o mal crescerá. Aliás, gosto de dizer que o mal hoje existente na política do Brasil, por exemplo, é fruto desta ausência dos leigos e das leigas da nossa igreja nos partidos políticos, nos cargos públicos e nos movimentos populares. Somos luz, assim nos disse Jesus (cf. Mt 5,13). A luz serve exatamente para afugentar as trevas. Se existe as trevas do egoísmo, da corrupção, da idolatria do poder, do perigo moral na política no mundo em que vivemos, faz-se mais do que necessário a presença dos cristãos leigos e das cristãs leigas para com a força do evangelho, fazer resplandecer a luz das virtudes da honestidade, transparência, partilha, compromisso com a vida, com a justiça e com a paz.
4. CNBB
<> Estudos nº 2 - Igreja e Política
05 - "A política é o conjunto de ações pelas quais os homens e as mulheres buscam uma forma de convivência entre os indivíduos, grupos, nações, que ofereça condições para a realização do bem comum".
A CNBB nos dá uma definição clara do que é política, que poderemos resumir assim: Política é um conjunto de ações para realizar o bem comum. Podemos perceber como se repete a questão da relação entre política e bem comum.  Por isso, como cristãos e cristãs, não tem sentido não atuarmos politicamente, não nos comprometermos com o bem comum, com tudo que isto implica: justiça, partilha, vida, paz. Não basta desejarmos um mundo melhor, é preciso participar das lutas para se chegar a esta conquista; a política é um caminho indispensável para a concretização deste projeto.
<> Documentos nº 40 - Igreja: comunhão e missão
219 - "Um candidato cristão, comprometido com a política partidária, por força de sua fé, nunca deveria afastar-se da sua comunidade, nem esta deveria marginalizá-lo pelo fato de ser candidato".
A CNBB nos dá neste documento dois critérios importantes para os cristãos e as cristãs que vão sair candidatos, candidatas a cargos eletivos: 1º) Não afastar-se da comunidade. Continuar sua vida normal de presença e participação na Igreja, nas celebrações litúrgicas, nas atividades pastorais e no exercício de ministérios. 2º) A comunidade não afastar a pessoa da caminhada porque ela é candidata. Isto é importantíssimo, pois, ainda existe esta atitude preconceituosa em nosso meio, ou seja, alguém é candidato tem que ser exilada da comunidade, como que se fosse portadora de uma doença contagiosa. Coloquemos isto em prática em nossa diocese, paróquia e comunidade e veremos frutos bons surgirem a partir de nós para a vida política do país, dos estados e dos municípios, alcançando assim o que diz este mesmo documento no nº 223:  alcançando assim o que diz este mesmo documento no na doença contagiosa. Coloquemos isto em pra de cristas atividades da C"A Igreja espera que os cristãos oriundos das CEB´s e de outros grupos e movimentos eclesiais sejam verdadeiras sementeiras de uma nova política no país".
<> Documento nº 62: Missão e ministérios dos cristãos leigos e leigas
132 - "Além da saudável e necessária participação de cristãos na política partidária, é necessário incrementar os grupos de reflexão e de acompanhamento das atividades políticas, exercendo cada vez mais a aproximação entre o compromisso de fé e o exercício da justiça por meio dos organismos de representação popular".
A CNBB afirma ser a política partidária saudável e necessária. Assimilar isto nos ajudará a superar qualquer resquício de preconceito contra a atuação dos cristãos leigos e das cristãs leigas nos partidos políticos. Façamos uma pesquisa em nossa comunidade para descobrirmos quantos são filiados a algum partido e a depender do resultado comecemos a trabalhar para incrementar a nossa presença e atuação neste campo de serviço social e eclesial.
A CNBB está também incentivando que se incremente a presença e atuação dos cristãos leigos e das cristãs leigas em grupos de reflexão e acompanhamento das atividades políticas. O próprio documento da CNBB, neste mesmo número assim se expressa: "Os grupos de Fé e Política devem ser incentivados e preparados para, entre outras atividades, acompanhar criticamente os trabalhos do legislativo local, fiscalizar a execução do orçamento público, elaborar projetos de lei de iniciativa popular, sensibilizar a opinião pública, divulgar relatórios sobre as atividades de vereadores e deputados, bem como dos responsáveis pelo Executivo".
<> Documento nº 80: Evangelização e missão profética da Igreja2.4. (página 96 do texto publicado pelas Paulinas) - "A política pode ser um caminho privilegiado para o serviço da justiça, ‘ uma forma sublime da caridade'. (...) a Igreja quer reabilitar a política, denunciando e lutando contra a corrupção, participando da administração da ‘res-pública', encorajando os cristãos a ‘entrar' na política e acompanhando os que já atuam neste campo".

Destaca-se neste texto:
a) A política como caminho privilegiado para o estabelecimento da justiça social;
b) A política como forma sublime de caridade, mandamento maior de Jesus.
c) A Igreja quer reabilitar a política. Reabilitar e não condenar; ajudar a melhorar a partir de dentro do mundo da política e não fugindo dela e acusando-a de ruim, coisa suja, etc.
d) A Igreja se compromete a denunciar e lutar contra a corrupção, bem como a participar da administração da coisa pública. Como anda o compromisso de nossa comunidade, paróquia e diocese com a aplicação da lei 9840 de combate a corrupção eleitoral? E nosso testemunho interno como Igreja na administração da economia e dos bens de nossas comunidades, paróquias e dioceses? Agimos com transparência, justiça e honestidade? E o que estamos fazendo para que os recursos públicos sejam corretamente aplicados? Estamos presentes nos organismos de fiscalização e acompanhamento da aplicação destes recursos?
e) Encorajar os cristãos para entrar e acompanhar os que já estão dentro. Que belo programa de evangelização. Como este programa está sendo cumprido em nossa realidade de diocese, paróquia e comunidade? O que temos feito para encorajar e o que temos feito para acompanhar?
<> Documento 87: Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil
187 - "Incentive-se cada vez mais a participação social e política dos cristãos leigos e leigas nos diversos níveis e instituições, promovendo-se cursos, grupos de reflexão, formação e ação".Neste documento a CNBB trás uma palavra de incentivo para cada vez mais acontecer uma participação social e política dos cristãos leigos e leigas. Isto faz parte dos objetivos da ação evangelizadora da Igreja no Brasil até 2010. Foi interessante a expressão "cada vez mais". Ela indica que esta participação social e política já existe, mas que precisa crescer, sempre mais e sempre melhor. Então, vamos lá, façamos nossa parte; ocupemos nosso espaço; cobremos apoio de nossos pastores (bispos e párocos); valorizemos o que já existe no campo da formação; colaboremos para que surjam novas adesões; construamos parcerias com cristãos de outras igrejas e com homens e mulheres de boa vontade crentes de outras religiões ou sem religião.

Pe. José Ionilton
Religioso Vocacionista
Publicado na Revista Espírito, edição nº 112


Fonte: Paróquia Aparecida

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