quarta-feira, 11 de março de 2015

O Brasil precisa urgentemente de uma Reforma Política, mas qual Reforma?

Por Thácio Siqueira

ZENIT:  Qual a relação entre CNBB e Reforma Política?

 Ivanaldo Santos – Inicialmente é preciso afirmar que a CNBB teve um papel fundamental no desenvolvimento e no amadurecimento da democracia no Brasil no período entre as décadas de 1970 a 1990. A CNBB ajudou a redemocratização do Brasil no período pós-regime militar (1964-1985), incentivou a participação popular e denunciou a corrupção. De um lado, ao incentivar e até mesmo propor a Reforma Política, a CNBB se coloca dentro dessa ampla tradição de luta pela democracia, pela liberdade e por maior participação popular. Isso tudo é muito positivo.

Do outro lado, nos últimos 10 anos a CNBB diminuiu drasticamente o número de pronunciamentos contra a corrupção e a favor da ética na política. Sem contar que setores do governo e o atual partido governista (o Partido dos Trabalhadores - PT) têm insistido numa Reforma Política como saída para resolver os grandes impasses da vida nacional. Essa coincidência pode passar a imagem para a sociedade civil que a CNBB é aliada e até mesmo conivente com o atual governo. Se a CNBB deseja uma Reforma Política, algo necessário ao Brasil, deve deixar bem claro a sua autonomia, a separação do governo e do Estado. A CNBB deve ser livre para criticar e cobrar uma postura ética do governo e do Estado. A submissão a um partido político e ao Estado é a pior situação que a Igreja e uma conferência episcopal podem viver.

ZENIT: O que significa uma conferência episcopal encabeçar uma campanha de Reforma Política?

Ivanaldo Santos – De um lado, isso é muito positivo, isso demonstra, de alguma forma, o protagonismo da Igreja no Brasil, uma Igreja preocupada com a ética e com a moralidade política. Historicamente, desde os primeiros cristãos, a Igreja é uma das primeiras instituições a ouvir e compreender o clamor de mudança que vem do povo e das ruas. Do outro lado, deve-se ter muita cautela.  A sociedade contemporânea vive uma espécie de retrocesso nas relações políticas e sociais, fala-se até que o século XXI ainda não começou. Existem propostas politicas neoautoritárias e populistas (Rússia, Turquia, Venezuela, etc) e o uso da religião como instrumento econômico e da violência (por exemplo, veja o caso do terrorismo).

Nesse contexto, CNBB precisa ter muito cuidado para não ser um dócil instrumento de poder nas mãos de partidos políticos, de sindicados, setores do governo e outros setores da sociedade. A CNBB precisa ter cuidado para não se transformar em um canal para a implantação no Brasil de um regime neoautoritário, como, por exemplo, o regime da Venezuela.



ZENIT: O projeto em questão, por exemplo, propõe o financiamento das campanhas com o dinheiro do povo, esse mesmo dinheiro público que mal dá para nos garantir saúde, educação e segurança, além de entrar no mérito das discussões de "gênero" e do voto de "lista fechada", tudo de acordo com a vontade do partido atualmente no poder. Por que um assunto tão opinável, e em pontos, até mesmo contrário à filosofia cristã, está sendo proposto como algo bom e que deve ser abraçado pelos católicos do Brasil?

Ivanaldo Santos – É preciso ver que o Brasil de fato precisa de uma Reforma Política que, entre outras coisas, dê mais agilidade às ações do Congresso Nacional, que torne os projetos de leis mais rápidos e eficientes, que permita uma intervenção e rápida solução em casos de crises políticas e institucionais.

No entanto, o atual projeto de Reforma Política é muito frágil e precisa ser debatido com a sociedade civil. É um projeto que, entre outras coisas, cai na simplicidade de achar que financiamento público de campanhas políticas vai resolver o problema da corrução eleitoral, que não deixa claro a questão da família, da natalidade e da sexualidade. É um projeto que, se for aprovado do jeito que está, abre as portas para que os cristãos, que são a maioria da população, sejam excluídos da vida política do Brasil.

A CNBB não pode cair nessa armadilha. A CNBB deve liderar uma Reforma Política no Brasil, mas que mantenha intactos os princípios cristãos (família, natalidade, sexualidade, casamento entre homem e mulher, proibição do aborto, etc). Uma medida que a CNBB pode fazer rumo a uma Reforma Política séria no Brasil é condenar a onda de corrupção que assola o atual governo e solicitar que, num gesto ético, os governantes e a atual Presidente da República renunciem a seus cargos e, com isso, abram um caminho pacifico para novas eleições e para a renovação do desgastado quadro político nacional. Além disso, a CNBB precisa liderar a sociedade civil para debater e lutar pelos verdadeiros problemas sociais, tais como: combate a corrupção, combate a crise econômica e combate ao desmonte dos sistemas de saúde e de educação do Brasil.

* Ivanaldo Santos é filósofo, escritor e conferencista brasileiro.

Fonte: Zenit

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